TERRA, ÁGUA E MARTE
Estamos entrando na era das grandes expedições a marte; um primeiro e titubeante passo de seis meses e cinqüenta e seis milhões de quilômetros, mais um custo adicional de alguns bilhões de dólares. Robôs americanos bisbilhotam tudo que encontram pela frente, mas infelizmente a tecnologia disponível ainda é insipiente, para que amostras reais sejam colhidas e trazidas para a terra. Contudo, o passo já é grande e descortinará uma miríade de segredos imprescindíveis ao entendimento de muitos detalhes científicos até hoje sem respostas plausíveis.
Análises fisiográficas daquele astro poderão explicar, por exemplo, qual a origem do universo, de onde viemos ou para onde estamos indo. Questões que permeiam o imaginário humano há milênios, talvez agora sejam respondidas através de estudos comparativos entre os dois planetas. Pelo menos, até agora, pelo que se noticiou, encontraram-se fosseis que só se formam em ambientes aquáticos, um forte indício de que há ou houve água. Ora, diz a ciência: "se há água, há vida". E aí, a inferência continua: se há vida, há marcianos por lá.
Ciência é assim mesmo; seu alforje é o absurdo utópico. O imaginário dando sempre lugar ao real. Foi assim com o avião, com o automóvel, com o telefone, com a televisão; por que não seria com a ciência cósmica? Que muitas coisas boas, no futuro, virão como resultado dessas sondagens espaciais, isso podemos ter absoluta certeza. Quanto a marcianos, talvez!...
Que bom seria se a sonda terráquea encontrasse por lá um bando de marcianos atrasados, pelados nas praias, transando inocentemente ao ar livre. Muito ouro e diamantes espalhados pelas florestas de madeira nobre e pelos leitos de riachos cristalinos. Um mundo, maravilhoso, onde não houvesse dinheiro, oportunistas, nem ambição, nem dominação, nem fome, nem guerras. Onde a lei mais forte fosse a lei do amor e do respeito.
Bastava, agora, nos próximos passos, bolarmos o envio de uma esquadrilha de naves tripuladas, armadas, até os dentes com bombas atômicas, tanques, metralhadoras e fuzis a-r quinze para tomarmos posse das riquezas virgens e escravizarmos aqueles marcianos idiotas e fracotes. Se possível, trazê-los para cá e introduzirmos mais uma espécie de discriminados dentre os tantos existentes por aqui.
Certa vez o cientista americano Carl Seagan discursando sobre o tempo de existência dos homens na terra, fez uma comparação muito interessante. Segundo ele o universo formou-se há aproximadamente dez bilhões de anos e a espécie humana existe nesse contexto há apenas oito milhões de anos. Uma insignificância. Para ilustrá-la dividiu dez bilhões por doze, atribuindo a cada doze avos um mês do ano. O primeiro doze avos correspondendo a janeiro, o segundo a fevereiro e assim por diante. Portanto neste ano imaginário em que cada mês corresponderia a oitocentos e trinta e três milhões e oitocentos e trinta e três mil anos, a espécie humana teria surgido somente no dia trinta e um de dezembro, ou seja, no último dia do ano, em termos proporcionais comparativos. Somos mais novos neste contexto quanto seria uma criança de um dia em comparação com o tempo de vida do tataravô, do tataravô do seu tataravô.
Portanto, inferências sobre as características dos corpos celestes, mesmo aplicando parâmetros científicos, é um exercício muito relativo. Marte teria sido um deserto sempre ou estaria um deserto nos últimos dois ou três ou trezentos milhões de anos? Se teve água e marcianos, quem ou o que teria acabado com tudo? Seria ele um planeta novo em formação, ou um velho em estado terminal?
Talvez uma civilização tão inconseqüente e devastadora quanto a nossa o tenha transformado num astro estéreo, um depósito de indícios. Como e quando saberemos? Em verdade vamos continuar tentando saber. Se não conseguirmos em Marte, partiremos para júpiter ou saturno e, talvez, os jupterianos ou saturnianos possam nos explicar.
Enquanto isso não acontece seria bom que começássemos a nos preocupar mais com nossa terra, porque senão, com certeza, em pouco tempo, talvez menos de duzentos anos, não sobre ninguém para receber tal explicação. Aí, talvez, eles é que cheguem até aqui para tentar entender nossa morbidez.
A terra já enfrentou várias grandes catástrofes e a última delas foi a aproximadamente sessenta milhões de anos, quando foram varridos da sua face os dinossauros. O impacto de um grande meteoro teria sido a causa mais provável. Há indícios de sobra, mas certeza nunca. Houve, ainda, as grandes glaciações, que também exterminaram muitas espécies e causaram transformações significativas na estrutura física do planeta. Há teorias que garantem que tais glaciações são cíclicas e que um dia acontecerão novamente. Tudo com sua dose de relativismo. No entanto a única coisa que se tem certeza é que estamos no limiar de uma grande catástrofe, essa sim, capaz de decretar o fim dos sistemas vivos na terra. A falta de água. O líquido da vida que numa era remota, talvez tenha existido em marte.
O problema é iminente, de uma complexidade formidável, mas ao que parece os homens de mando ainda não acreditaram e vêm tratando-o com acanhadas abordagens tangenciais, acadêmicas e de gabinete. Campanhas de esclarecimento e de racionalização do uso, aplicação de impostos e sobretaxas. Nada disso resolverá o problema e não é difícil entender por que. A humanidade há muito vem desprezando uma lei matemática básica: "quanto mais aumentarmos o divisor, menor será o quociente".
Há alguns anos atrás o senhor cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugênio Sales, numa abordagem sobre controle da expansão demográfica entre as camadas mais pobres da pirâmide social - justamente a parcela mais procriante - declarou: “somos contra, pois o pobre também tem direito à vida”. Tal posição é de uma magnanimidade indiscutível e ninguém teve a ousadia de tocar mais no assunto. De lá para cá a população, só do Brasil, pelo menos, quase duplicou e estamos esperando o colossal patamar de duzentos e cinqüenta milhões de brasileiros para os próximos trinta anos. O mundo, nessas alturas, terá chegado aos nove ou dez bilhões de seres pensantes e o pior é que, quando lá chegarmos, os primeiros mortos de sede serão os pobres.
Agora a CNBB, resolveu partir na frente e estabelecer a campanha da água. Muito oportuna, mas também muito incipiente. Certamente, o ano que vem ninguém se lembre mais disso e continuaremos nos multiplicando para dividirmos recursos eternamente estáveis e não renováveis. Que bom seria se os bispos deixassem de lado a subjetividade e liderassem, com sua natural influência, uma campanha que esclarecesse que, quantos mais formos mais próximos do fim estaremos.
O planeta é pequeno e seus recursos naturais escassos para atender à célere explosão de demanda por espaço e coisas. Por isso é natural a pressão contínua de populações sobre bens indispensáveis à vida. A produção crescente de detritos é muito maior que a capacidade de reciclagem da natureza e naturalmente a saturação de mananciais continuará aumentando inevitavelmente. Os recursos energéticos serão cada vez mais insuficientes diante das legiões crescentes e seus processos de produção, dentro dos padrões atuais, estão comprovadamente destruindo o ecossistema e novos processos, apesar de possíveis, provavelmente também não terão capacidade de atendimento tão grande e rápida. Não há maiores áreas de produção agrícola disponíveis no mundo, com exceção de alguns pontos isolados do planeta - dentre eles o Brasil - o que é muito pouco, tendo em vista a perspectiva de aumento incontrolado de demanda. Some-se a isto a alta longevidade verificada, hoje, em todo o mundo, o que vem contribuindo sobremaneira para o crescimento das médias demográficas.
O elemento água é uma espécie de espírito da terra, pois tem algo em comum com a espiritualidade. É onipresente, multiforme e, por vezes invisível. Tem participação em todos os processos de transformação da matéria, agrega-se a ela, faz parte da sua composição físico-química, mas jamais sofre alteração em sua própria estrutura. É indestrutível e, por isso, sempre foi e será água. Portanto, na verdade, faltar água é mais uma força de expressão que uma realidade. O que, certamente acontecerá este relacionado à aleatoriedade dos fenômenos naturais, ou seja: todo efeito tem uma causa e o homem tem funcionado, tão somente, como causador de danos, contudo, ainda é um mero desconhecedor das prováveis reações da natureza.
Agressões aos elementos indispensáveis à vida, a água e ao ar, não serão capazes de destruí-los, mas certamente alterarão os sensíveis mecanismos que os mantém em constante circulação através do planeta e conseqüentemente dos demais subsistemas que regulam o clima, a distribuição das chuvas e por fim a estabilidade dos ecossistemas regionais e da sua biodiversidade; da qual somos, também, diretamente dependentes. Esta fechado o círculo vicioso que poderá criar um meio ambiente inóspito, capaz de banir o fenômeno da vida do planeta terra.
Existe um ditado sábio que ensina: a natureza não reclama cobra. E pelo que parece já anda cobrando com bastante freqüência. As intempéries estão mais freqüentes e mais fortes e os padrões comportamentais dos sistemas naturais vêm si modificando com muita rapidez. Um deles e o mais grave é o aquecimento global com a perigosa diminuição das calotas geladas.
É chegada a hora de encarar o problema com desenvoltura. Seria mais produtivo racionalizar a natalidade e assim, nos preocupando com aqueles que não devem mais nascer, certamente, teremos um legado a mostrar para nossos extraterrestres.
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