A morte, como sempre, tem o poder de redimir os homens de suas faltas e até, muito mais que isso, é capaz de ampliar várias vezes o nível do status e dos feitos do falecido. Não há explicação plausível nos parâmetros do mundo material e, talvez, somente a extrapolação para o subjetivismo do espírito, que, com certeza, também nos compõe, contenha a explicação para esta espécie de fascínio que nutrimos pelos mortos.
Estamos tristemente vivenciando a lamentável perda do grande João Paulo II e nem mesmo seu caso fez exceção à regra. É óbvio e claro que em vida ele foi a própria face do incomum, a começar pelo tempo em que esteve à frente da Santa Sé. Quase vinte e sete anos de tapas de luvas na inflexibilidade, na ambição, na falsidade e na burrice que vem infernizando a humanidade desde os seus primórdios. Ele foi um desses predestinados, que, vez por outra, vêm ao mundo, com certeza, enviados por Deus, para alavancar a humanidade da “mesmice”, do ostracismo e da falta de criatividade. Intrigou todos pela sua postura mansa e natural diante das pluralidades naturais que caracterizam a criação divina, mas que os deuses do mundo humano e materialista sempre teimaram em não aceitar.
Mirando em igualdade no coração e nos anseios dos homens e fechando os olhos às diferenças históricas e escravizantes foi, talvez, o único homem nos vinte séculos do cristianismo, capaz de resgatar a imagem de Cristo da utopia romântica, através da real comprovação de que somente através da solidariedade o homem poderá resolver os problemas que o acercam.
Mas infelizmente, para macular a pureza das homenagens póstumas, para lá convergiram também os proxenetas e salafrários da humanidade, responsáveis pelos infortúnios e infelicidades dos fracos e fazendo do Templo do Amor um palco iluminado pelos holofotes promocionais. Ou seriam os últimos convertidos penetras das portas dos fundos?
Dizem que um político cheira o outro. João Paulo era um político hábil, mas do bem e não compartilhava das sutilizas do maquiavelismo. Portanto, seu cheiro não era característico. Daí resta-nos mesmo acreditar no poder redentor da morte. Diante dela, até os chacais transforma-se em cordeiros. Não importa de que lado estejam.
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