Esse nosso idioma pátrio é mesmo tão rico e muitos desses nossos políticos são mesmo tão safados que nessa linha direta de proporcionalidade sempre é possível saber onde se encontra o ponto de interseção entre picaretagem e riqueza vernacular. Pensando bem, desde que o Brasil é Brasil e desde que me entendo por gente essas linhas têm formado interseção na vida e no bolso do cidadão, corporificadas em roubalheira, que gera miséria, violência social e pior; envergonha o brasileiro que fica obrigado a ver seu país na cabeceira do ranking dos mais corruptos do mundo. Mas na onda da histórica beleza lingüística e políticos caras de pau ainda há uma outra questão a se refletir: o Brasil, país pobre ou pobre país? Eis a questão! Pobre, porque antes de tudo é um pobre país. Desde o descobrimento vem sendo espoliado noite e dia e a escola portuguesa foi tão eficiente que a moda pegou e há mais de quinhentos anos não sai do prêt à porter. O caso é tão sério e a ladroagem tão acentuada, que há até classificação prá ladrão. Na desastrosa hierarquia há desde pés de chinelo afanadores de calcinha no varal, que vão para a cadeia, até os famosos colarinhos brancos surrupiadores de informações privilegiadas com potencial para render bilhões de dólares, que vão para a Suíça. Quem duvida que pergunte a um famoso presidente estadista de estado capenga vendilhão.
E o palhaço cidadão? Esse coitado; apenas vota democraticamente e paga impostos ditatorialmente.
Assim foi até que o mundo deu tantas voltas e, quando finalmente, tentaram furtar o saco do povo e não conseguiram, porque esta bem dependurado na conscientização que vem sendo construída a duras penas pela imprensa quase livre brasileira; um desses palhaços cidadãos teve a brilhante idéia de conclamar seus pares a assinarem um “manifesto mãos limpas” contra “os fichas sujas”. Mais de um milhão e seiscentas mil assinaturas prá lavar a sujeira da política brasileira e mesmo assim as consciências inconscientes do parlamento brasileiro ainda tentaram jogar o bólido quente na mão da justiça, que saindo da sua dinâmica inércia, devolveu o mesmo e nem desembrulhou, pois o cheiro estava por demais desagradável. A partir daí os parlamentares, se vendo em apuros no iminente risco de tirar o pão de cada dia da bocarra dos pobrezinhos maganões, entraram em pânico e então deu-se início à terrível luta entre a sucuri e o boi. Um puxa dum lado, outro doutro; finca pé de cá, enrola rabo de lá, bufa, estica, encolhe, grunhi; até que caiu do céu um apaziguador de altíssima consciência social e reconhecidos serviços prestados aos palhaços cidadãos brasileiros, que redigindo um texto histórico pensou que conseguiria dar fim ao inédito embate. Doce ilusão, pois o prestimoso redator não é bom em português, com certeza diplomou-se numa dessas “escolas para todos” no sistema de “promoção progressiva” do Ministério da Educação; aquele que sempre faz estatística prá cego inglês ver; e, sem querer, trocou “tenham sido” por “forem”.
As más línguas dizem que foi proposital:
– ele queria deixar uma sutil brecha na lei, a fim de salvar os mequetrefes do passado impedindo que novos venham chafurdar no bolo do futuro. Eu particularmente não acredito na sua perspicaz má fé. Pode ser que o sistema operacional do seu computador esteja senil e seu velho editor de texto o tenha traído, trocando as formas verbais na hora errada. E você pacato cidadão, o que acha? Concorda comigo ou com as más línguas?
Bom; independentemente da nossa opinião, a verdade é que graças a Deus e à conscientização cidadã a lei “ficha limpa” esta aprovada e fazemos votos que não siga o funesto destino daquelas outras que só existem para ninguém fazer cumprir. Lentamente a luta popular vai surtindo seus frutos e juntamente com a lei da “probidade administrativa” constituirão ferramenta capaz de frear a sanha dos salteadores dos cofres públicos, da nossa dignidade e paciência. Outubro esta batendo às portas e em breve estarão tomando posse alguns milhares de novos administradores com a incumbência que se dispuseram a cumprir por livre espontânea vontade. Fazemos votos que o novo aparato de leis, o aparelho fiscalizador e a imprensa continuem ativos no sentido, não só de melhorar a imagem do Brasil, como também a qualidade da nossa vida de pacatos palhaços pagadores de impostos.