O BOI BRASIL SÓ ANDA À BASE DE CHUTE NO TRASEIRO!
Foi naqueles tempos de antanho, quando se amarrava cachorro com
lingüiça; toda a mercadoria pesada era transportada na tração animal e
carros de boi no seu rolar modorrento venciam subidas e descidas de
caminhos tortuosos, estreitos barrentos. Som lamurioso rompendo o
silêncio das grotas e olhos atentos vindo correndo
pairar às janelas e soleiras das vilas beira estrada, para ver a
procissão cantante puxada por bois carreiros de olhares perdidos; passo
no compasso do guizo e do grito do boiadeiro, que energicamente exigia
mais força e atenção à base do chucho nos traseiros, ora na dupla da
frente, ora nas duplas de trás, ora no puxão de orelha e tapa no focinho
dum e doutro, que, de vez em quando, teimavam em retardar o passo.
Repentinamente cessava-se o canto. Afrouxavam-se cangas e arreios. Água
fresca serviam-se aos viajantes: tanto homem quanto bois mereciam a
recompensa, afinal a viagem durara horas, o sol quente, peso pra mais de
tonelada, puxões, freadas, solavancos; tudo contribuíra para aumentar
ainda mais a sede e o cansaço!
Mas a parada era rápida e também
para descarregar no armazém da vila os tambores de querosene de lampião,
a madeira do telhado da igreja, que, de tão podre, despencara há meses e
os sacos de farinha encomendados para as quermesses das irmãs de
caridade do convento de Santa Maria da Aparição, aquele que abrigava
moças cabeçudas, arteiras e namoradeiras...
Isso foi um sonho?
Talvez para os jovens, que certamente nunca viram um carro de bois,
possa parecer que seja. Porém, os mais vividos, principalmente aqueles
que nasceram e se criaram nos sertões, carregam em suas memórias essas
lembranças nostálgicas de um Brasil arcaico, colonial e provinciano,
nada condizente com a velocidade transformativa com que a tecnologia
moderna vem impondo ao modus vivendi do brasileiro contemporâneo.
Todavia, se tudo mudou para melhor, pois, segundo alguns remanescentes mais
velhos, hoje tudo é mais fácil com a ajuda da energia elétrica, das
comunicações, do automóvel, das comodidades de toda ordem; apesar de que
os custos sejam altos e estão sendo cobrados da natureza e até da saúde
das pessoas; parece que o governo brasileiro e, quando me refiro à
administração pública, estou apontando para ambas as esferas
governamentais, na grande maioria das ocasiões, ainda dormita naquele
tempo, quando a vida passava no rolar, no passo e no som estriduloso dos
saudosos carros de bois
Exemplo mais em voga é o caso da vindoura
copa do mundo de 2014. Todos sabemos das metas a que o Brasil se
comprometera, a fim de atender aos parâmetros de qualidade exigidos pela
FIFA. Mesmo que tais metas custem os olhos da cara de cada brasileiro e
o retorno seja incerto, ainda assim o governo fechou todos os contratos
e além disso fechou também os olhos deixando que mais de dois anos
passassem sem que nada se fizesse. Assim certamente seja mesmo melhor
para quem não tem costume nem a intenção de se preocupar com detalhes de
orçamentos. Quanto menos tempo melhor para os mãos leves e olhos
compridos trabalharem fora de controle.
O Ministro do Esporte Aldo
Rebelo, com aquele seu sotaque de cantor de baião desafinado, chegou a
se desentender com o representante da FIFA, quando ele, apavorado com o
ritmo de carro de bois do governo brasileiro, acertadamente, afirmou que
o Brasil precisava de um chute no traseiro. O ministro desafinado se
ofendeu, cortou o diálogo, exigiu pedido formal de desculpas e a troca
de interlocutor. Infelizmente não perguntou a opinião dos brasileiros,
pois se o fizesse, teria ouvido a mesma coisa. Desde a escolha do Brasil
para anfitrião dos jogos da Copa de 2014, não há um só brasileiro
despreocupado com o andamento quase parado das milhares de providências
que não saem do papel, nem do grito dos boiadeiros governamentais.
Agora, que falta pouco mais de um ano para o evento, estamos vendo o que
é para ser visto. As arenas estão ficando prontas. A que custo, não
interessa saber. Os aeroportos, dizem que ficarão; a que custo, não
interessa saber. A tão propalada mobilidade em vias de acesso
desentupidas, certamente funcionará, porque, pelo menos em dias de
jogos, vão parar escolas, empresas e, se precisar, o Brasil inteiro,
para deixar as vias de acesso vazias.
Enfim, o chute no traseiro
não foi aceito oficialmente, mas existe e esta funcionando. Em junho de
2014 tudo estará impecável. O Brasil, bem ou mal, mais caro ou muito
mais caro, vai cumprir o prometido e o mundo vai invejar nossa
capacidade de trabalho e realização em tempo e hora.
Enquanto isso, o resto...nem é bom falar! O boi Brasil deitou e até está dormindo
Quem dera doravante um órgão como a FIFA, talvez com um outro nome:
FCQS - FEDERAÇÃO CELESTIAL DE QUERUBINS E SERAFINS - pudesse ter o poder
de dar um chute no traseiro, não só do Boi Brasil, mas também nas
nádegas de alguns tantos outros Bois Políticos profissionais que
democraticamente ganham votos do povo para cumprir bem, com eficiência,
responsabilidade e ética suas funções e em vez disso se refestelam nas
benesses do poder à custa da miséria do povo e do atraso do Boi Brasil.
ANTONIO KLEBER DOS SANTOS CECILIO
APRESENTAÇÃO
O conjunto de trabalhos que o amigo leitor encontrará aqui foi produzido ao longo de alguns anos. Não posso aqui precisar quantos, talvez uns vinte. A grande maioria deles publicada no jornal A TRIBUNA SANJOANENSE de SÃO JOÃO DEL REI (minha terra nanal) e NOVA MIDIA de BARBACENA; ambas tradicionais cidades históricas mineiras muito politizadas.
Obviamente há uma cronologia de publicação associada aos acontecimentos que inspiraram as respectivas reflexões. Depois de muito pensar, se deveria mencionar datas, resolvi aboli-las, pois achei que correria o risco de tornar seu passeio um tanto dirigido e até cansativo. Posso imaginar alguém lendo algo retratando fato acontecido há anos! Talvez se sinta entediado. Então, no intuito de instigá-lo, apresento uma miscelânea de trabalhos recentes e antigos, a fim de lhe subtrair, de propósito, qualquer direcionamento e deixá-lo livre para pensar, buscando no tempo, por si, tal associação. Acredito ainda que dessa forma esteja incitando sua curiosidade à medida que avance passos adentro. Sua leitura poderá inclusive ter início pelo fim ou pelo meio, que não haverá prejuízo algum para a percepção de que as coisas no Brasil nunca mudam. Ficará fácil constatar que a vontade política é trabalhada para a perpetuação da incompetência administrativa, obviamente frutífera para algumas minorias.
Penso que, se me dispus a estas publicações, deva estar antes de tudo, suscetível a criticas e, portanto, nada melhor que deixá-lo, valendo-se unicamente das informações contidas no texto, localizar-se na história. Caso não lhe seja possível, temo que o trabalho perca qualidade perante seu julgamento pessoal. Por conseguinte, acredito que isso não acontecerá; a não ser que o leitor não tenha, em tempo, tomado conhecimento dos fatos aqui retratados. Procurei selecionar de tudo um pouco; certamente sempre críticas, porém algumas muito sérias carregadas de um claro amargor. Outras, mais suaves, pândegas e até envoltas num humor sarcástico. Noutras retrato problemas da minha São João del-Rei. Até cartas para congressistas em Brasília há. E em alguns pontos, para abusar da sua paciência, introduzi coisas muito particulares. Críticas à parte, nessas, apenas falo de mim, afinal, apesar de amigos, talvez nunca tenhamos trocado impressões sobre coisas tão pessoais. . .
Aqueles que me conhecem há tempos, sabem que sou um obstinado por política, apesar de jamais tê-la exercido diretamente. Motivos houve de sobra e numa oportunidade poderei explaná-los. Todavia, do fundo do coração, afirmo que tal paixão tem como motor um doloroso inconformismo por ver o Brasil tão esplêndido e tão vilipendiado; vítima inconteste dessa cultura avassaladora de demasiada tolerância à antiética e à imoralidade na administração pública. Comprovadamente este é o pior dos tsunames com potencial para ter retardado nosso progresso mais de três séculos e grande responsável pela perpetuação da pobreza de metade da nossa população, pelo analfabetismo total e funcional, pela violência social e pelo abismo intransponível que aliena gigantesco contingente, maior que um quinto da população do continente sul americano. Diante do inaceitável absurdo, impossível me conformar em silencio diante dos atos e fatos que vão vergonhosamente enxovalhando nossa história e nos deixando como um gigante deitado sobre o escravismo que a Lei Áurea não foi capaz de abolir.
O título? Esse, talvez, seja o mais difícil explicar. GRITOS SEM ECOS representa uma espécie de pedido de socorro do náufrago, que sabe que de nada adiantará espernear, pois não há interlocutores, não há socorro, não há saída, não há conscientização; mas, assim mesmo, grita.
Será um prazer receber sua visita e ler suas opiniões, elogios ou críticas.
Forte abraço!
segunda-feira, 22 de abril de 2013
O BOI BRASIL SÓ ANDA À BASE DE CHUTE NO TRASEIRO
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