A televisão, num dos seus programas humorísticos apresentado há muitos anos: o “BALANÇA, MAS NÃO CAI” criou uma personagem interessante para parodiar o coronelismo nordestino e ao mesmo tempo zombetear dos militares que governavam o Brasil. Tratava-se do desastrado e pândego coronel das Forças Desarmadas do Brasil. O patusco militar trajava terno de linho branco, ostentava um chapelão de abas largas, botinas pretas, esporas e o indefectível óculos Ray Ban. De vez em quando, ao se aborrecer, sacava o revolver enferrujado e mal carregado. Diante do vexame da falha do tiro ele o arremessava no oponente e ameaçava aos berros:
- da próxima vez em te pego!
Depois de tantos anos a imagem do velho coronel retorna oportunamente à lembrança diante do também velho, porém negligenciado, desafio do Brasil salvaguardar suas gigantescas riquezas naturais e sua inefável soberania. Logo depois da abertura política e da posse do presidente Sarney, quando os retornados do exílio dentre eles os fantasiosos neoliberais, começaram a crescer no cenário político nacional, deu-se início à discussão sobre o real papel das forças armadas brasileiras, cuja imagem enxovalhada, trazida dos tempos da ditadura, era fantasmagórica demais para os defensores dessa democracia pirotécnica* que sonhavam instalar no país. Obviamente temiam que os militares não se contivessem ao seu papel precípuo nas artes da guerra e foram contra sua revitalização tecnológica interpondo o argumento de que o Brasil é um país de tradição pacífica, circunscrito entre vizinhos amigos e que, em caso de ameaças mais sérias, os Estados Unidos se incumbiriam da nossa defesa. Além do mais, havia centenas de prioridades no âmbito social – as quais não cumpriram nem dez por cento – que deveriam merecer atenção maior que a simples perda de tempo e dinheiro investido em algo de menor importância, que o país podia e devia prescindir.
Daquela época em diante, nossas forças armadas impuseram-se um silêncio sepulcral e restringiram-se aos muros dos quartéis, sem verba nem para gasolina e manutenção adequada da frota; muito menos para novos aparelhamentos e modernização tecnológica. Os salários do pessoal foram minguando a ponto de um oficial general ganhar menos que muitos coronéis de polícia pelo país afora. O contingente foi reduzido e a semana de trabalho não mais incluía, nem as tardes de quarta, nem muitas sextas feiras.
Enquanto isso, a farra com os recursos públicos se multiplicava irracionalmente em todas as esferas do poder, desde a prefeitura mais simples, até os mais altos escalões governamentais. Na outra ponta da linha trataram de azeitar os motores da engrenagem tributária a ponto de estrangular o contribuinte com uma das maiores cargas tributárias da galáxia e de consolo uma oferta de serviços em pé de igualdade com o Gabão. Em seguida quebraram todos os bancos estatais e depois os rifaram juntamente com outras grandes empresas públicas insolventes pela roubalheira sempre escudados na desculpa esfarrapada de que: “mais valiam em mãos alheias do que em poder do governo”.
De quebra roubaram do Brasil sua condição de grande exportador de armas de guerra e navios, certamente por não acharem conveniente um país habitado por um povo altamente civilizado e pacífico tratar dessas coisas brutas capazes de machucar interesses estrangeiros. Fernando Henrique, diante da imponência arcaica e inoperante do porta-aviões Minas Gerais, foi à França adquirir outro com histórico de honrosos serviços prestados à marinha daquele país na segunda grande guerra, cujo término registrara-se há quase sessenta anos, pelo qual o país investiu a desprezível importância de vinte e quatro milhões de dólares e ainda tiveram a brilhante idéia de batizar a obsoleta enterprise* barroca com o santo nome de São Paulo.
Nesse ínterim, alguns governantes de países reconhecidamente expansionistas declaravam explicitamente, liderados pelo presidente russo Michail Gorbatchov, que a biodiversidade amazônica e suas inimagináveis riquezas deveriam ser consideradas de interesse internacional, cuja exploração deveria ser monitorada por observadores estrangeiros. Alguns anos mais tarde, o mundo passaria a discutir a eminente escassez de água doce em alusão diretas aos imensos recursos hídricos amazônicos e brasileiros. E mais recentemente o visionário e temperamental presidente da Venezuela, Hugo Chaves; vem trabalhando para transformar seu país numa ilha fortificada inundada de armamentos russos, exatamente ali nas nossas barbas auriverdes.
Até quando a prodigiosa inteligência brasileira continuará anestesiada pela crença de que não necessitamos de grandes defesas, ninguém pode prever. Contudo, seria bom se a crença de que Deus é brasileiro tivesse mesmo fundamento, pelo menos no combate ao estrabismo estratégico da nossa inteligência burra.
Mas felizmente depois que a Petrobrás anunciou ao mundo a gigantesca descoberta de petróleo na camada do pré-sal e a quarta frota da marinha americana foi avistada rondando nossas fronteiras marítimas e petrolíferas o presidente Lula apressou-se a telefonar para Jorge Bush, a fim de lembrá-lo da velha amizade que sempre norteou as relações americano-brasileiras e mais recentemente, com o acirramento da contenda Argentino-Britânica pelo controle das Ilhas Malvinas, o Brasil discretamente se posiciona a favor da Argentina disfarçado na falsa desculpa de que somos povos irmãos, quando, na verdade, a grande preocupação é com a rota de navios de guerra ingleses próxima ao nosso quintal aurífero.
Graças ao bom Deus brasileiro, Lula, enfim, lembrou-se de investir na armada marítima incrementando a construção de submarinos a propulsão nuclear com tecnologia nacional. Pena que o projeto, se esse não for mais um devaneio governamental, somente deverá começar a virar realidade daqui a, pelo menos, dez anos. Até lá, se as escassas verbas governamentais faltarem e americanos ou outros quaisquer crescerem os olhos nos nossos ovos negros, talvez nos sobre a opção de agir como aquele coronel grotesco e atiremos nossas cangalhas flutuantes e voadoras contra as robustas fortalezas atômicas dos amigos; obviamente sem nos esquecermos do grito de guerra:
“DA PRÓXIMA VEZ EU TE PEGO!”.